se no/do leito me vires ausente, se pressentires
a ausência do meu nome, avança
até à varanda azul do fruto, e escolhe
a melhor copa de árvore para a calibração
das minhas veias
se a árvore não entrar imediatamente em flor
e as noites forem sanguinárias,
não desesperes; sabe que também o leite
pode enegrecer e o vento emudecer
aguça o olhar, performa os ritos,
e entrega-te por momentos ao delírio e à volúpia
de todos os presságios; mas, confia no oráculo
das amendoeiras em flor e no pranto crepuscular
das flautas arrebatadas pelos zéfiros
o meu corpo encarnará das tuas pontas dos dedos
perscrutando os espaços (e o meu nome) poro a poro,
e eu far-me-ei de novo
pétala a pétala
emergirei do sossego dos lagos
que olhas nos fins de tarde, ou dos nódulos
da madeira do soalho, onde te deitas
serei o teu leito, e terás de novo
a minha boca
fruto a fruto
findar-se-ão os lutos e agonia das paredes
e não mais terás de amolar facas com o coração,
andar madrugadas à chuva, ou subir às copas das árvores
à procura da minha boca,
poderás de novo atear-me pelos tornozelos, que,
como tu dirias, incendiar-me-ei, e
não mais terás de beber o alcatrão das trovoadas
ou congeminar abcessos nos sonhos, que
serei a presença, a carne ateada do meu nome
até às pontas das falanges dos dedos, que te tocam
com o peso e a massa certa de um coração em flor
poderei perfumar-te de caules
poderás crescer-me em redor da cintura
poderás saber os meu nome veia a veia
e ver-me crescer-te em redor dos ombros
e orquestrar solstícios e equinócios
colcheias de lume e clareiras de pássaro
(eu, que te amo e quero gume a gume)
mulher cujos cabelos
têm o perfume das constelações e o júbilo
das copas em flor: sou o teu corpo verídico;
és a minha aurora de pulso, as
minhas veias todas correctas para
a construção da permanência
não mais atires o coração, aos frutos,
aos rios
2 comentários:
oh, menino, este poema está brilhante. simplesmente brilhante. - estás a usar pronomes de uma forma belíssima -
bjo*
obrigado!* bem, ao que parece tenho de voltar atrás, ao que considero, de uma certa forma, despojos de um percurso. este é já um poema com uns bons 3 anitos. tenho constatado muito ultimamente que os meus poemas de há alguns anos, e que eu, talvez injustamente, considero despojos, são talvez os que mais interessam: erros fundamentais!
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