domingo, 1 de março de 2009

quesito (le proces de j'arc) que magnífico filme do Bresson!!!

breviário de momentos - (o furibundo estaleiro do poema ou o dito por não dito; o poema no cepo)

«Um dia li num livro: "Viajar cura a melancolia".» (é)


como desatar o nó do vento
em torno do cepo em flor


e libertar o peso dos naufrágios
nas florestas pululantes de insectos
e odores ao meio-dia

também à devassa édipo respondeu
com enigmas

(é quando mais se sabe que menos se vê)


é quando sol atinge o zénite
que os insectos enlouquecem

e os pássaros de messiaen vêm povoar
o quintal do poema



(porque) também a ave procura a clareira
para dedilhar o poro de areia do verão
mas é junto à raiz do inverno que colhe
o tumulto e a música

também os homens se escondem no fundo no silos
junto ao inebriante aroma dos cereais

quando a primavera

se aproxima do mundo


(que pensariam no exacto segundo antes
de perderem a cabeça, esses reis que um dia
subjugaram a fertilidade da terra?)

depois de crescer rumo equidistante céu
também a rosa pede expensas à palavra
que a funda na água turva,
bem junto de onde os pés das danças antigas
auscultaram já tantas vezes florida a raiz
da urtiga


porque não há planta que não cresça com destino

(há uma resposta que legitime o enigma,
como há uma voz que justifica o silêncio?)

porque aqueles que um dia perderam
toda a clave de sol do mundo
afiam as lâminas no escuro, e odeiam,
as metáforas, e esperam, hienados,
na calada da noite o momento certo
para o seu xadrez

a esses, os que estão distantes,
não os interpela
nunca a voz que inicia a viagem
rumo às salinas

a esses
mais depressa os atingirá a fecha
do avesso

a esses devora-os o vento no cepo


também ao fogo deu jean d'arc
a outra face


(um poema assim a céu aberto
nem se assemelha a um poema
evita o rigor em proveito da verdade
escolhe sempre o caminho a direito
porque é sem dúvida o mais cumprindo
porque é sem dúvida o mais difícil)

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