breviário de momentos - (o furibundo estaleiro do poema ou o dito por não dito; o poema no cepo)
«Um dia li num livro: "Viajar cura a melancolia".» (é)
«Um dia li num livro: "Viajar cura a melancolia".» (é)
como desatar o nó do vento
em torno do cepo em flor
e libertar o peso dos naufrágios
nas florestas pululantes de insectos
e odores ao meio-dia
também à devassa édipo respondeu
com enigmas
(é quando mais se sabe que menos se vê)
é quando sol atinge o zénite
que os insectos enlouquecem
e os pássaros de messiaen vêm povoar
o quintal do poema
(porque) também a ave procura a clareira
para dedilhar o poro de areia do verão
mas é junto à raiz do inverno que colhe
o tumulto e a música
também os homens se escondem no fundo no silos
junto ao inebriante aroma dos cereais
quando a primavera
se aproxima do mundo
(que pensariam no exacto segundo antes
de perderem a cabeça, esses reis que um dia
subjugaram a fertilidade da terra?)
depois de crescer rumo equidistante céu
também a rosa pede expensas à palavra
que a funda na água turva,
bem junto de onde os pés das danças antigas
auscultaram já tantas vezes florida a raiz
da urtiga
porque não há planta que não cresça com destino
(há uma resposta que legitime o enigma,
como há uma voz que justifica o silêncio?)
porque aqueles que um dia perderam
toda a clave de sol do mundo
afiam as lâminas no escuro, e odeiam,
as metáforas, e esperam, hienados,
na calada da noite o momento certo
para o seu xadrez
a esses, os que estão distantes,
não os interpela
nunca a voz que inicia a viagem
rumo às salinas
a esses
mais depressa os atingirá a fecha
do avesso
a esses devora-os o vento no cepo
também ao fogo deu jean d'arc
a outra face
(um poema assim a céu aberto
nem se assemelha a um poema
evita o rigor em proveito da verdade
escolhe sempre o caminho a direito
porque é sem dúvida o mais cumprindo
porque é sem dúvida o mais difícil)
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